Hijab na Bíblia e no Torá (parte 1 de 2): Hijab nas denominações cristãs

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Descrição: A história do uso do véu e da cobertura da cabeça na igreja cristã.

  • Por Aisha Stacey (© 2017 IslamReligion.com)
  • Publicado em 23 Jan 2017
  • Última modificação em 17 Nov 2019
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HijabinBibleTorah1.jpgO significado literal de hijab é velar, cobrir ou ocultar.  Abrange mais do que apenas um código de vestimenta e está relacionado com os limites morais e respeito à mulher.  É parte de coesão da comunidade e de comportamento modesto.  Entretanto, o termo hijab tornou-se intercambiável com a palavra lenço.  O significado às vezes é estendido a padrões de vestimentas culturais como a burca do Afeganistão, o chador do Irã e o shalwar khamis do Paquistão.  O hijab tem vários significados e nessa série de artigos focaremos no hijab como cobertura de cabeça e discutiremos o hijab na Bíblia e no Torá. 

O primeiro exemplo registrado do uso do véu ou cobertura do cabelo para as mulheres está nos textos legais assírios, do século 13 AEC.  Seu uso era restrito às mulheres nobres.   Prostitutas, servas e mulheres pobres eram proibidas de cobrir seus cabelos/cabeças.   Nos impérios grego e romano da antiguidade há evidência que aponta para vários graus de cobertura de cabeça usado pelas mulheres.  Particularmente em Roma, parece que cobrir a cabeça era associado com oração e devoção.  Na Grécia as evidências determinadas por esculturas e peças de cerâmica da época leva muitos a acreditar que mulheres respeitáveis cobriam suas cabeças quando estavam fora de casa.  À medida que são feitas novas descobertas, nossas opiniões sobre o grau e razões para cobrir aumentam e diminuem, mas podemos ter certeza que cobrir a cabeça ou cabelo das mulheres não era uma prática desconhecida.

É interessante que os versículos bíblicos aos quais os cristãos se referem quando explicam por que as mulheres devem cobrir suas cabeças, especialmente em oração ou na igreja, tenham nos chegado por meio de Paulo em suas cartas aos Coríntios.  Corinto era uma cidade situada na península ao sul da Grécia e era parte do império romano durante o período em que Coríntios foi escrito.  Era um caldeirão cultural das culturas romana, grega e judaica e, assim, é pertinente refletir quais normas culturais foram retidas, enquanto a cidade mudava de mãos e impérios.  

1 Coríntios 11:5 diz que: "Mas toda mulher que ora ou profetiza com a cabeça descoberta desonra a sua cabeça, porque é a mesma coisa como se estivesse rapada." As cristãs primitivas cobriam suas cabeças na igreja e a qualquer momento quando estavam em público e continuaram a manter essa prática de alguma forma ao longo dos séculos até os séculos 19 e 20, quando a prática declinou rapidamente.  

Em Corinto e em toda a história cristã a cobertura da cabeça era, e ainda é em alguns locais e denominações, considerada um sinal de submissão à autoridade, a Deus ou ao marido.  Os cristãos no Egito do século 2 eram encorajados pelo teólogo cristão Clemente a "... ir para a igreja vestidos decentemente, com passada natural, abraçando o silêncio, de posse de amor não fingido, puro no corpo e no coração, adequado para orar a Deus.  Que a mulher observe isso ainda mais.  Que esteja inteiramente coberta, a menos que esteja em casa.  Porque esse estilo de vestir é sério e protege de olhares.  E nunca cairá quem coloca a modéstia diante de seus olhos e seu manto; nem convidará outro a cair no pecado ao descobrir seu rosto.  Porque esse é o desejo da Palavra, uma vez que é adequado para ela orar com véu."[1]

As raízes históricas do uso do véu na Europa ocidental remontam ao império bizantino, onde os códigos do uso do véu atribuíam alto nível social às famílias cujas mulheres usavam o véu.  Na Idade Média era costume que as mulheres casadas cobrissem seus cabelos com estilos variados.  Pinturas de mulheres urbanas na Europa ocidental geralmente retratam tudo coberto, exceto o rosto e as mãos.  Na época, camponesas e trabalhadoras que não se cobriam eram consideradas "livres" e alvo fácil para ataques.  Essa retratação não respeitável de mulheres descobertas também aparece no contexto muçulmano, onde o Alcorão diz que usar o véu ou se cobrir indica o status elevado das crentes.  

"Dize a tuas esposas, tuas filhas e às mulheres dos crentes que (quando saírem) se cubram com as suas mantas;  isso é mais conveniente, para que distingam das demais e não sejam molestadas; sabei que Deus é Indulgente, Misericordiosíssimo." (Alcorão 33:59)

Diz-se que uma cristã que se torna freira "toma o véu".  Isso é em referência ao ato de cobrir a cabeça.   As freiras ao longo da história cristã têm sido reconhecidas por suas coberturas de cabeça características, muitas das quais se parecem com o hijab muçulmano.  Em tempos medievais em todo o mundo ocidental as casadas normalmente cobriam seus cabelos quando estavam fora de suas casas, e os véus das freiras eram em geral baseados em estilos seculares, refletindo a posição de uma freira como "uma noiva de Cristo".  Dizia-se que as freiras abriam mão da vida secular para servir a Deus, mas recebiam o respeito e honra dados à uma mulher casada modesta.

Há alguma evidência que sugere que o uso do véu na Espanha foi influenciado pelos resquícios do império islâmico andaluz e por muçulmanas do vizinho norte da África.  A cobertura em renda leve conhecida como mantilha passou a ser usada na Espanha no final do século 16 e era comum nas missas católicas em todo o mundo.  A rainha Isabela II da Espanha encorajou ativamente seu uso dentro e fora da igreja.  Após sua abdicação em 1870, o uso da mantilha tornou-se limitado a ocasiões formais e missas.  Estranhamente, a exigência para que as mulheres cobrissem suas cabeças na igreja não foi introduzida na lei canônica até 1917.   A partir de então e até 1983, o código de lei canônica da igreja católica ordenava que as mulheres usassem véus ou cobrissem suas cabeças.  Antes de 1917 não havia essa lei, embora o uso de chapéus ou véus fosse costume para as mulheres.

Embora o uso de véus e lenços tenha diminuído, existem algumas denominações cristãs nas quais a prática manteve seu status elevado e é mandatória em alguns casos.  Por quase 2.000 anos as mulheres ortodoxas têm ido à igreja com suas cabeças cobertas, sejam elas gregas, sérvias, russas, egípcias ou sírias.  A igreja ortodoxa universal impôs um código de vestimenta baseado na não distração da oração.  Na Albânia as cristãs geralmente usam véus brancos e nas igrejas cristãs ortodoxas albanesas as mulheres são separadas dos homens por divisórias de treliça.  Muitas denominações protestantes cristãs menores usam algum tipo de cobertura de cabeça ou hijab.  Elas incluem os amishes, os menonitas e os huteritas.  Nas denominações protestantes em que não há expectativa oficial que as mulheres se cubram, algumas escolhem cobrir a cabeça de acordo com sua compreensão de 1 Coríntios 11.  Muitas católicas escolhem cobrir suas cabeças para imitar a Virgem Maria.  Maria, a mãe de Jesus, cobria a cabeça e o cabelo de acordo com os costumes judaicos da época que exploraremos no próximo artigo, junto com costumes judaicos posteriores do uso do hijab.



Notas de rodapé:

[1] Clement of Alexandria, Paedagogus [The Instructor], Book III. Chapter XI. Tradução para o inglês de Ante-Nicene Fathers.

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Hijab na Bíblia e no Torá (parte 2 de 2): Hijab no Torá

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Descrição: A história do uso do véu e da cobertura da cabeça no Judaísmo.

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Hijab_in_the_Bible_and_Torah_(part_2_of_2)_por-BR._001.jpgAs judias modernas que cobrem o cabelo atribuem vários significados ao ato.  Para algumas é um sinal de casamento, outras um símbolo de piedade e humildade, talvez um ato de deferência à vontade de Deus.  Também é considerado um sinal de modéstia.  Em tempos bíblicos, no Oriente Médio e mundo greco-romano antigo era costume que o cabelo fosse coberto pelas mulheres respeitáveis e livres, pelo menos as casadas.  O Velho Testamento (Torá) menciona cobrir a cabeça ou cabelo de maneira breve, mas essa poucas palavras se desenvolveram em um ritual complexo de hijab praticado por judias devotas em todo o mundo.

A afirmação de que cobrir o cabelo era uma injunção bíblica vem de uma pequena passagem no livro de Números, referindo-se ao sacerdote descobrindo ou afrouxando o cabelo de uma mulher como uma punição ou humilhação.  Descreve uma cerimônia que testa a fidelidade de uma mulher acusada de adultério.  De acordo com o Torá, o sacerdote descobre ou destrança o cabelo da mulher acusada como parte da humilhação que precede a cerimônia e pode ser encontrada no livro de Números 5:18.  

Outras ordens conclamando as judias a usarem o hijab ou cobrir o cabelo vêm do corpo literário conhecido coletivamente como Talmude.  Mulheres que saíam com o cabelo descoberto estavam praticando um ato inaceitável, tão inaceitável que era considerado justificativa para divórcio.  Em uma sociedade tão altamente consciente da sexualidade e seus perigos, o uso do véu era considerado uma necessidade absoluta para manter a modéstia e a castidade.  Alguns rabinos até consideravam a exposição do cabelo de uma mulher algo tão socialmente inaceitável quanto a exposição de suas partes íntimas.  Assim, era ordenado às casadas que cobrissem o cabelo em espaços comunais e muitos rabinos até proibiam as recitações de bênçãos na presença de uma mulher com a cabeça descoberta. 

As leis de modéstia encontradas no Talmude agiam para tornar a mulher inacessível ou indisponível a todos, exceto ao marido.  A cobertura do cabelo era um aviso que significava que a mulher era casada e respeitável.  Embora o hijab judaico seja um símbolo de submissão, também é uma distinção honorífica.  Quando uma mulher casada cobre sua cabeça é um símbolo de uma dignidade maior atribuída a ela.  Muitas mulheres consideravam cobrir a cabeça um ato equivalente ao da rainha usar uma coroa. 

No Judaísmo bíblico e pós-bíblico o uso do hijab passou a representar parte do ciclo de vida das mulheres, simbolizando o movimento de passagem da virgindade à condição de mulher.  Até a Idade Média cobrir a cabeça estava firmemente enraizado como obrigação religiosa em todo o mundo judaico.  Essa era a mesma obrigação que, na época, existia nas esferas de influência cristã e muçulmana. 

O primeiro desafio sério à cobertura de cabelo tradicional veio do uso de perucas.  Uma prática que começou na corte francesa logo se espalhou pela Europa e nas comunidades judaicas.  A prática foi denunciada pela primeira vez pelas autoridades judaicas que investiram contra o que parecia ser uma imitação inadequada dos modos dos não-judeus.  Muitos mantinham que a proibição tradicional contra as mulheres mostrarem o cabelo era prevenir a atração feminina de fazer os homens terem pensamentos pecaminosos.  A peruca, alegavam, podia evocar os mesmos sentimentos que o próprio cabelo da mulher.  Apesar disso o uso de perucas logo se enraizou nas comunidades judaicas e foi finalmente aceito. 

Apesar disso muitas judias continuaram a achar difícil usar uma peruca, ao invés de lenços e véus mais tradicionais e algumas usam perucas, mas as cobrem da maneira usual.  O uso de perucas como cobertura de cabelo também teve um retorno nos séculos 19 e 20, quando as judias precisaram participar da vida secular, mas não queriam comprometer éditos religiosos.  Quando as pressões externas da vida europeia forçaram muitas judias a saírem de cabeça descoberta, algumas acharam mais conveniente substituir o véu tradicional por uma peruca.  

Embora não vinculado de maneira inexorável com o uso de perucas, a prática de raspar o cabelo de uma mulher no casamento se tornou prevalente na Europa central no que é conhecido como o período inicial da lei judaica moderna.  Assim muitas mulheres escolhiam raspar suas cabeças para que nenhum cabelo escapasse de sua peruca ou lenço.

Nos séculos 20 e 21 houve desconsideração generalizada pela prática de cobrir o cabelo.  Entretanto, judeus voltados para religião continuam a confrontar o problema.  Existem rabinos que toleram a falha do costume com a compreensão de que a sociedade mudou e não é mais considerado falta de modéstia deixar o cabelo descoberto, mas em geral a cobertura da cabeça continua a ser uma questão problemática.  Hoje a maioria das judias não cobre o cabelo, exceto na sinagoga.

Para judias e muçulmanas a modéstia é uma parte importante de suas crenças, influenciando suas vidas diárias de muitas maneiras, como a forma como andam, se vestem e interagem com outros.  Ambas as religiões encorajam a modéstia, canalizando a beleza de uma mulher para onde ela de fato pertence, que é dentro de seu casamento.  Ambas as religiões levam suas leis de modéstia muito a sério e o hijab é considerado uma maneira de viver, ao invés de apenas um lenço, peruca ou véu.  Em uma determinada época, e a apenas 100 anos atrás, a maioria das denominações cristãs também considerava cobrir o cabelo e se vestir modestamente como parte integrante de suas crenças religiosas.  No século 21 esse comportamento ficou geralmente restrito a denominações minoritárias, mas ainda assim, até certo ponto, tanto o Cristianismo quanto o Judaísmo ainda consideram vestimenta e comportamento modestos como norma.  

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